Quem está pensando em saúde, bem-estar e felicidade nas organizações?

Se fizéssemos uma pesquisa sobre quem está pensando em saúde e bem-estar nas empresas, a grande maioria responderia a área de Recursos Humanos, não é mesmo? Precisamos falar sobre isso. Ao longo dos últimos anos, principalmente no contexto pós-pandêmico, “saúde mental” virou uma espécie de mantra no contexto corporativo. Um mantra entoado, muitas vezes, pelo RH. Nunca se falou tanto e de forma tão aberta sobre temas tão espinhosos e difíceis. Mas, ao mesmo tempo, as ações parecem poucas diante do desafio que temos pela frente. 

A consultoria norte-americana Gallup acaba de divulgar sua pesquisa anual intitulada “Relatório sobre a situação do local de trabalho global de 2023: a voz dos funcionários do mundo”¹. Trata-se de um levantamento global, com mais 160 países participantes e que traz informações alarmantes. 

Enquanto alguns funcionários florescem no trabalho, encontrando recompensa diária em suas tarefas, a grande maioria, cerca de 59%, está silenciosamente desistindo, um comportamento que ficou muito conhecido com o termo “quiet quitting“. Isso não é apenas um problema na perspectiva do indivíduo; é um terremoto econômico que deveria tirar o sono dos acionistas, dos conselhos de administração, dos comitês executivos e da alta liderança em geral. A estimativa de que a baixa motivação custa à economia global a astronômica quantia de US$8,8 trilhões e representa 9% do PIB mundial deveria ser um chamado urgente para todas as organizações. 

A pesquisa da Gallup aponta que medir a satisfação do funcionário não é suficiente; é preciso medir o envolvimento. Envolver-se significa estar presente psicologicamente, compreender o propósito do trabalho, ter um ambiente de suporte. O verdadeiro engajamento transcende o contentamento; é o estado de prontidão para o trabalho, em que os profissionais entendem o porquê de seu labor. 

Precisamos expandir o desafio de saúde e bem-estar nas organizações como tema que vai além do “pessoal do RH”. Como profissionais dedicados a pensar a gestão de pessoas e de talentos nas empresas, não podemos incumbir o funcionário de

autogerenciar questões de saúde que, em grande medida, são consequência de questões complexas e estruturais. 

Ao longo de 2023, um grupo de estudos muito heterodoxo (e especial) de pessoas se dedicou a pensar a questão da saúde, bem-estar e felicidade nas organizações. Posso dizer que é uma turma de sonhadores. Somos muito diversos: comunicadores, psicólogos, palhaços, instrutores de meditação e mindfulness, terapeutas do riso, advogados de startups, conselheiros de novos modelos de trabalho… O que torna esse grupo especial não é apenas a singularidade de cada participante, mas sua capacidade de pensamento crítico. De se propor a um debate de ideias mais profundo e complexo, em que não cabem respostas rasas. 

É um alívio e um sopro de esperança saber que um grupo como esse existe. Mas, pensar saúde, bem-estar e felicidade nas organizações não pode ser tarefa apenas dos idealistas. Essas questões precisam ocupar o centro e o topo das organizações. Tampouco é tarefa para adiar para o planejamento do ano que vem. Tem que ser para já. 

A busca pelo bem-estar e pela saúde nas organizações não é um capricho, uma ação da estratégia ESG, mas antes de tudo uma necessidade. É preciso que a comunicação, a diversidade, o diálogo e o respeito estejam enraizados nas empresas, não como políticas isoladas ou discursos superficiais, mas como uma filosofia organizacional, um novo jeito de ser. 

Essa é uma revolução que precisa acontecer em todas as salas de reuniões e corredores corporativos. Aqueles que têm a sabedoria de compreender isso serão os verdadeiros arquitetos do futuro do trabalho. 

¹State of the Global Workplace 2023 Report. The voice of the world’s employees. Disponível para download em 

gallup.com/workplace/349484/state-of-the-global-workplace.aspx.

Artigo escrito por Keite Pacheco de Carvalho, cofundadora do Círculo de Comunicação e participante do Grupo de Estudos “Saúde, Bem-estar e Felicidade nas Organizações” da ABRH-SP.

(São Paulo, 26 de Fevereiro de 2024)