É impressionante a capacidade de nossos ministros do STF em intervir na vida cotidiana das empresas, quando apreciam matéria trabalhista, demonstrando que pouco se importam com os reflexos e repercussões que tais decisões acarretam no relacionamento com os empregados, sindicatos e mesmo na sociedade em geral.
A recente decisão, ainda não publicada mas já divulgada, quanto à ADI 5322 que trata dos dispositivos trazidos pela lei 13.105/2015, chamada de lei dos motoristas, ao considerar inconstitucionais 11 dispositivos da mencionada Lei, especialmente os que tratam do intervalo fracionado e acúmulo com o descanso semanal, tempo de espera em carga e possibilidade de praticar descanso na boleia do caminhão quando em movimento.
Muito compreensível a nobre preocupação de nossos julgadores com a saúde e segurança dos trabalhadores, mas certas decisões como essa deveriam passar pelo Congresso, Negociações Coletivas e mesmo ouvir-se a sociedade e partes envolvidas, pois elas têm repercussão inimaginável.
Pensemos como agora será a viagem de um caminhão, que se desloca do sul do país para o norte, mais de 3.500 kms, com um ou dois motoristas, em um veículo refrigerado, que não pode parar, por conta de transportar produtos comestíveis ou mesmo farmacêuticos ou ainda químicos, que exigem temperatura ambiente adequada para chegar ao seu destino? Como será computado o tempo de trabalho desses profissionais, ainda que cada um se reveze na direção e mesmo no repouso, ainda que o veículo esteja em movimento? Claro que a decisão prolatada passa a exigir o cômputo de todo este tempo de deslocamento, sem qualquer intervalo a considerar e sem nenhum repouso. Certamente o custo desse transporte será muito elevado, devido às horas extras que terão que ser pagas aos trabalhadores.
Além disso, imaginemos que esta mesma carga encontre um problema de queda de estradas, pontes, inundações ou ainda um congestionamento monstro, como os vividos durante o embarque de safras, quando os portos enfrentam filas intermináveis para que chegue a vez de determinadas cargas serem carregadas ou mesmo problemas ferroviários, muito comuns em determinadas épocas, seja por chuva, seja por outros problemas imprevisíveis, como um acidente grave, por exemplo.
Enfim, simplesmente ignorar tais situações sem oferecer alternativa ao transportador ou mesmo aos sindicatos envolvidos, para que negociem ou tratem de situações extremas como as relatadas, fará com que o custo disso tudo seja transferido simplesmente para o consumidor, agravando ainda mais o preço de serviços e produtos, pois não haverá alternativa para estes transportadores senão corrigir seu frete e mesmo os distribuidores o preço final dos produtos vendidos.
São repercussões muito graves e que não poderiam ficar sem uma solução. Aliás, mais uma vez uma decisão que supostamente é emitida para proteger o trabalhador, certamente terá efeito contrário, pois isso levará transportadores a buscar soluções mais baratas e sem tanto controle, como a contratação de transportadores autônomos, sem vínculo trabalhista, pois para esses a lei é a de oferta e procura, não a lei própria de empregados celetistas.
Cada um desses dispositivos agora cancelados possuía uma destinação, um objetivo, que era dar alternativa ao empregador de motoristas e ajudantes celetistas a cumprirem a lei, mas a decisão do STF os empurra a buscar saídas nada ortodoxas, não restando muitas opções a não ser buscar outras alternativas de transporte, que supram as proibições destacadas pelo STF.
Os sindicalistas e as transportadoras deveriam se unir e reforçar a necessidade de tais instrumentos legais, inclusive através de novos projetos de lei ou ainda de convenções e acordos coletivos próprios, que agora possuem prevalência sobre a própria lei, como forma de mostrar à sociedade que não concordam com certos rumos adotados pelos ministros da mais alta corte do país.
Escrito por:
Wolnei Ferreira
Advogado e administrador, pós-graduado em Recurso Humanos, é sócio titular do escritório Ferreira Rodrigues Sociedade de Advogados. Atua também como diretor jurídico da ABRH-Nacional e da Sobratt – Sociedade Brasileira de Teletrabalho e Teleatividades, diretor tesoureiro do Sindicato das Sociedades de Advogados de SP/RJ e membro convidado do Conselho Superior Jurídico da Fiesp.