Os Perigos Ocultos do Crédito Consignado

Os juros altos no cenário econômico atual são uma resposta das autoridades monetárias para conter a inflação, mas eles também encarecem o crédito tradicional, restringindo o acesso a financiamentos para muitas pessoas e pequenas empresas. Em dezembro de 2024, 76,7% das famílias brasileiras estavam endividadas, de acordo com a Pesquisa de Endividamento e Inadimplência do Consumidor (Peic) da Confederação Nacional do Comércio (CNC). Esse dado alarmante ilustra como, em um ambiente de preços inflacionados, trabalhadores que recebem crédito consignado subsidiado tendem a utilizá-lo não para poupar ou investir de maneira produtiva, mas para quitar dívidas existentes. Essa escolha representa uma tentativa imediata de alívio financeiro, mas não promove um ciclo de crescimento econômico saudável.

O crédito consignado é frequentemente oferecido com juros mais baixos, pois as parcelas são descontadas diretamente do salário do trabalhador, o que reduz o risco para os credores. No entanto, esse arranjo diminui o controle que o trabalhador tem sobre sua própria renda mensal, comprometendo seu orçamento de maneira inflexível. Oferecer “dinheiro mais barato” para um trabalhador já endividado, sem uma educação financeira adequada e sob pressão inflacionária, pode intensificar um ciclo vicioso de endividamento. Isso significa tomar novos empréstimos para pagar os antigos, resultando em uma deterioração ainda maior da saúde financeira.

A longo prazo, o comprometimento de parte do salário para o pagamento de empréstimos restringe a capacidade das famílias de lidar com emergências financeiras, investir na educação dos filhos ou simplesmente melhorar sua qualidade de vida. Quando combinado ao aumento do custo de vida, esse cenário pode levar a uma crescente vulnerabilidade econômica e insegurança alimentar do trabalhador e de suas famílias. Além dos efeitos econômicos, o endividamento crescente provoca também impactos psicológicos. O estresse associado à insegurança financeira pode prejudicar a saúde mental, resultando em ansiedade e afetando negativamente as relações familiares, espalhando-se para as relações do trabalho.

As políticas populistas que prometem soluções rápidas sem abordar as causas profundas dos problemas econômicos muitas vezes acarretam consequências indesejadas. Enquanto o crédito fácil parece uma solução momentânea, ele não resolve questões como a desigualdade de renda, a falta de acesso a empregos de qualidade ou a necessidade de uma política fiscal mais justa. Em vez de depender de expansões econômicas artificiais geradas por crédito ao consumo, é essencial implementar reformas que promovam qualificação profissional capazes de gerar empregos e crescimento sustentável – políticas públicas. Aí que o governo deveria investir, não na concessão de “crédito subsidiado”. O que o trabalhador mais se recente é de políticas públicas voltadas à sua qualificação, não de dinheiro barato.

Concluindo, é fundamental adotar uma abordagem econômica e financeira mais responsável e sustentável, que vá além de soluções imediatistas. Qualquer política de facilitação de crédito deve ser acompanhada de iniciativas que promovam a educação financeira e práticas que fortaleçam a resiliência econômica tanto em nível individual do trabalhador quanto coletivo, de todos trabalhadores. É isto que o governo sabe mas não quer fazer. O populismo tem custo.

São Paulo, 25 de Março de 2025

Escrito por José Eduardo Gibello Pastore
José Eduardo Gibello Pastore é membro do CORHALE, sócio da Pastore Advogados, mestre em Direito das Relações Sociais pela PUC-SP e advogado trabalhista.